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03/10/09

A SUBLIMAÇÃO DA ESPERTEZA

A esperteza é uma característica cada vez mais apreciada na sociedade portuguesa. Como se desse uma certa cor ao ambiente de depressão. Nos dias de hoje, ser esperto em Portugal não anda muito longe de ser herói: alguém que, num clima desfavorável, atinge os seus objectivos sem olhar a métodos nem problemas de consciência. Estes novos heróis, que o povo começou por encarar com reprovação mas já se resignou a olhar num misto de complacência, admiração e inveja, nada têm de altruísta. Ao contrário do Super-Homem ou do bombeiro que resgata a criança do fogo, não querem salvar ninguém. São apenas espertos. Mais do que sobreviver, fazem pela vida. Alguns têm até mais do que uma vida, o que dá imenso jeito. Falhada a primeira encarnação, podem sempre partir para mais tarde regressar do além-túmulo, um local naturalmente mortiço onde é fácil recarregar baterias (…).

Os portugueses veneram a esperteza. Todos os dias a perseguem e tentam incorporar na escala do seu pequeno poder individual, seja como condutores no trânsito ou como vulgares mamíferos na fila do supermercado. Em Portugal, os bons exemplos são menosprezados. Não basta ser competente, honesto, colocar brio no que se faz e, se não for pedir muito, fazer uso frequente dessa coisa chamada inteligência emocional - um conceito que nada tem de transcendente e que, depois de bem espremido, resume-se a respeitar e saber viver com os outros.

Acontece que pensar para lá do umbigo é sintoma de fraqueza neste país. Confunde-se com ingenuidade, falta de pulso. É neste contexto que os espertos vingam. Que vivem, morrem e ressuscitam
FRANCISCO CAMACHO, iOnline, 17-08-09

22/08/09

COMEÇA HOJE O RAMADÃO

O Ramadão é o nono mês do calendário islâmico. É o mês durante o qual os muçulmanos praticam o seu jejum ritual (suam, م وْ صَ ), o quarto dos cinco pilares do Islão: professar e aceitar do credo, orar cinco vezes ao longo do dia, pagar dádivas rituais, observar as obrigações do Ramadão e fazer a peregrinação a Meca.

A palavra Ramadão encontra-se relacionada com a palavra árabe ramida, “ser ardente”, possivelmente pelo facto do Islão ter celebrado este jejum pela primeira vez num período quente.

Uma vez que o calendário islâmico é lunar, não é celebrado todos os anos na mesma data, podendo passar por todas os meses e estações do ano, conforme a progressão dos anos, porém sua duração é entre 29 e 30 dias. O mês inicia-se com a aparição da lua no final do mês de sha'ban (oitavo mês no calendário lunar muçulmano).

Este período é um tempo de renovação da fé, da prática mais intensa da caridade, e vivência profunda da fraternidade e dos valores da vida familiar. Pede-se ao crente maior proximidade dos valores sagrados, leitura mais assídua do Alcorão, frequência à mesquita, correcção pessoal e autodomínio.

Durante todo o mês é observado o jejum (incluindo as relações sexuais), da alvorada ao pôr-do-sol. O crente deve, não só abster-se destas coisas, mas também não pensar nelas e manter-se concentrado em suas orações e recordações de Deus.

Bem antes da alvorada, durante a madrugada, há uma pequena refeição (Su-Hoor) que substitui o pequeno-almoço habitual e é considerado uma bênção enviado por Deus, segundo o Alcorão.

No término de cada dia, com o início do crepúsculo é obrigação do muçulmano quebrar o jejum imediatamente, mesmo antes da oração, devendo pronunciar, segundo Maomé, as seguintes palavras: "Foi-se a sede, hidrataram-se as veias, e alcançou-se a recompensa, com a permissão de Deus".

Segue-se o iftar ( راطفإ ), refeição que reúne os membros da família e os seus amigos, numa celebração de fé e de alegria. Após esta refeição, é prática social sair com a família para visitar amigos e familiares e reunirem-se para a prática da oração.

Actualmente, com a ampliação do diálogo interreligioso, algumas pessoas de outras religiões são convidadas a partilhar este momento de convívio e é cada vez mais frequente que cristãos ofereçam e celebrem um iftar para os seus amigos muçulmanos.

Fonte: Wikipédia

02/08/09

ALUNOS COM MÉDIAS MAIS ALTAS VÊM DE FAMÍLIAS ABASTADAS


Os cursos com médias mais altas, como Medicina, são tendencialmente preenchidos por alunos de famílias com mais recursos, revela um estudo na Universidade de Lisboa (UL), que conclui que o acesso ao ensino su­perior não é "apenas uma questão de mérito".
O estudo foi dirigido pela socióloga Ana Nunes de Almeida, coordenadora do Observatório dos Percursos dos Estudantes da UL, a partir de dados recolhidos junto de alunos que se matricularam pela primeira entre 2003 e 2008.
Num documento com as principais conclusões, os autores destacam que a actual população universitária tem vindo a diversificar-se desde os anos 80, "do ponto de vista das suas origens sociais, dos seus percursos ou expectativas individuais", trazendo para as universidades uma "geração numerosa de jovens provenientes de grupos com menores capitais culturais e económicos".
No entanto, segundo os dados recolhidos, as vagas dos Cursos que requerem notas mais elevadas, como Medicina, Belas Artes e Farmácia, são preenchidas principalmente por alunos com origem em famílias mais favorecidas, cujos pais são "quadros dirigentes e superiores das empresas ou da administração pública, especialistas das profissões científicas e intelectuais, técnicos e profissionais de nível intermédio".
Por outro lado, "as faculdades com notas de acesso mais baixas (Letras, Psicologia e Ciências da Educação) recrutam sobretudo alunos provenientes de famílias mais desfavorecidas, as filhas e os filhos de empregados administrativos, pessoal dos serviços e vendedores, operários e artífices", salienta o estudo.
Os autores destacam que quase 60 por cento dos caloiros da UL provêem de famílias mais favorecidas.
''As modalidades de acesso não são portanto apenas uma questão de mérito individual, mas um assunto de família num cenário de selecção social", concluem.

in GLOBAL Notícias, 02-03-2009

30/07/09

O PAPA E O PRESERVATIVO

Cada vez que o Papa se pronuncia sobre a contracepção, e nomeadamente contra o uso do preservativo, o mundo, em especial o Ocidente, entra em convulsões. Desta vez, foi numa viagem a África e desde a França à última ONG ou à última consciência humanitária ninguém se esqueceu de protestar. O Papa é um irresponsável e um criminoso. O Papa é uma espécie de encarnação do Mal. Há aqui com certeza um equívoco. Suponho que ninguém estava à espera que em África, sobretudo em África, Ratzinger não dissesse uma palavra sobre o assunto e, dizendo, dissesse qualquer coisa diferente da doutrina ortodoxa da Igreja. Muito pelo contrário, do ponto de vista dele, era ali, numa situação extrema e manifestamente ambígua, que devia reafirmar o que julga ser a verdade. Para quem combate (ou simplesmente conhece) a epidemia de sida em África, a posição do Papa não tem desculpa. Recomendar a abstinência e a fidelidade (e ainda por cima, a título profiláctico) nunca serviu de nada em parte alguma. E em África muitas populações resistem ao preservativo não apenas por ignorância mas porque ele nega ou ameaça a sua cultura e a própria organização da sociedade. A palavra do Papa vem dar força a essa resistência (que, de resto, não beneficia o catolicismo) e provoca directamente milhares, se não milhões, de mortes. A fúria universal contra Bento XVI não custa a compreender. Só que o Papa não se guia nem age por uma lógica "prática" e científica. Aceita, presumo, as vantagens do preservativo. Só que não o pode aprovar sem trair a Igreja.Os valores de Bento XVI não são os valores de um governo, de uma ONG ou de um indivíduo que tenta limitar o imenso desastre da sida em África. São valores de outra ordem. São valores de uma ordem religiosa, que cada vez menos se percebem ou respeitam no Ocidente. Não vale por isso a pena discutir a moral sexual da Igreja (e do Papa). Vale a pena garantir que ela não invade a esfera da liberdade civil. Ora Ratzinger não andou por África a pedir que se proibisse o preservativo. Pediu aos católicos que prescindissem dele, em nome de uma perfeição que os católicos escolheram procurar. A influência dele é, neste capítulo, deletéria? Inegavelmente. Convém que ela não alastre em África (e na Europa)? Sem a menor dúvida. Mas sem esquecer que o Papa está no seu direito e no seu papel.

20/07/09

HÁ 40 ANOS: PRIMEIRO HOMEM NA LUA




AINDA HÁ QUEM JULGUE QUE TUDO FOI MENTIRA
Quatro décadas depois do primeiro contacto do Homem com a poeira inerte da Lua, sondagens referem que 6 % dos ame-ricanos pensam que as alunagens não poderiam ter acontecido. A chegada à Lua, um dos maiores feitos da raça humana, foi um embuste elaborado e desenvolvi¬do para fomentar o orgulho patriótico dos EUA, insistem muitos.
Examinam as fotografias das missões, procurando sinais de falsificação e afirmam que conseguem ver a bandeira dos EUA a flutuar naquilo que era supostamente o vazio do espaço. Exageram os riscos para a saúde das viagens através das ondas de radiação que envolvem o nosso planeta; subestimam a proeza tecnológica do programa espacial americano; e denunciam como crimes todas as mortes ocorridas nesse programa, relacionando-as com uma conspiração a nível mundial.
E embora não haja provas credíveis que consubstanciem estas afirmações, e a mera improbabilidade de se conseguir inventar um enredo tão gigantesco e mantê-lo secreto durante 40 anos seja um desafio à imaginação mais delirante, os negacionistas continuaram a amontoar acusações até hoje. (…)
"Há pessoas inteligentes e perfeitamente normais que acreditam nessas teorias da conspiração", diz Philip Plait, astrónomo e autor que contesta, exaustivamente, ponto por ponto, os argumentos dos teóricos da conspiração no seu site "Bad Astronomy".
Embora as pseudoprovas dos teóricos da conspiração possam ser facilmente refutadas, diz Plait, compreender os processos pode exigir conhecimentos históricos, fotográficos e científicos e respectiva metodologia. "Dá trabalho; muito trabalho", diz ele, "e a maioria das pessoas não o faz E, assim, essas coisas criam pernas para andar".

10/07/09

ERA NO CAMPO QUE SE CONSUMIA MAIS PÃO EM PORTUGAL

Quem vive na cidade come mais leite, queijo e iogurtes do que os que vivem no campo. Já nas zonas rurais, há uma maior apetência por cereais e pão que nas áreas urbanas. Assim se comia em Portugal há 20 anos. E hoje? Ninguém sabe, pois estas conclusões são do único inquérito alimentar nacional já feito. Que data de 1985.Com a disseminação de hipermercados pelo país, a maior ligação entre interior e litoral e a diversificação da oferta o mais natural é que muito tenha mudado. No entanto, o inquérito feito pelo Instituto Ricardo Jorge há duas décadas dá conta que, em média, cada português ingeria (sem contar com as bebidas) 1549 gramas de alimentos por dia e, embora as opções variassem em relação à situação geográfica, tanto urbanos como rurais equilibravam-se, com ligeira vantagem dos habitantes das cidades, que deglutiam mais uns gramas.Os alimentos mais consumidos eram, por ordem, a batata (309,3 gramas), o pão (252,1), o leite e iogurte (203,6) e as hortícolas (198,3). Consumia-se mais carne que peixe, mas a diferença não era substancial - 92 gramas de peixe para 122 de carne. Numa coisa, portugueses do campo e da cidade igualavam: o consumo de açúcar. A gulodice não dependia da geografia. Só que a quantidade consumida - 31,3 gramas era muito inferior ao consumo real do país, que se situava nas 81 gramas. Ou seja, conclui o estudo, deve ser nos cafés e restaurantes que se fazia a maior parte da ingestão de doces. Outro dado interessante: consumia-se 11 por cento de alimentos a menos do que os que se encontravam disponíveis no mercado. O Algarve era o campeão dos comedores de peixe, os habitantes no distrito de Évora não eram muito adeptos da batata e da fruta, o Alentejo adorava leite, os de Bragança abusavam das gorduras e os de Lisboa eram os maiores comilões de todos. No estudo não surgem, porém, informações sobre o consumo de sal.
ANA FERNANDES, Público, 14-03-2009

14/06/09

A PRAGA DE PIOLHOS QUE GEROU MODA

Na viagem da família real portuguesa para o Brasil, há mais de dois séculos, em duas das naus houve praga de piolhos, obrigando as senhoras - aristocratas incluídas - a cortar o cabelo de forma radical. Quando chegaram ao Rio de Janeiro, foram imitadas por se pensar que a cabeça rapada era moda na Europa. Por que é que no Reino Unido se conduz pela esquerda? Henrique VIII da Inglaterra rompeu relações com o papado de Roma por este não lhe conceder a anulação do primeiro casa­mento (com a espanhola Catarina), para poder casar com quem amava. O rei proibiu então que se entrasse em Londres pelo lado direi­to, para contrariar o costume romano. Porque no passado, o lado esquerdo era considera­do maligno, como a superstição dizia que o canhoto era ruim, a minha mãe obrigou-me a escrever com a mão direita, e hoje escre­vo com as duas, porque nunca deixei de ser canhoto.
AROLDO MARTINS, Plenitude, nº72, Junho de 2009

08/06/09

LÍNGUA TRAIÇOEIRA

As línguas podem realmente ser muito traiçoeiras. Quando pela primeira vez alguém me disse, casualmente num encontro social nos Estados Unidos da América, que era muito anal, a minha reacção foi empalidecer, engolir em seco e perguntar: "Excuse me?" O contexto e as circunstâncias não eram de forma nenhuma sexuais, pelo que aquilo que soava a uma revelação intima pareceu-me, no mínimo, desadequada.
Para os nativos da língua inglesa, referências à analidade desse tipo nada têm de sexual. Referem-se tão-só a um tipo de personalidade, caracterizado por uma certa necessidade de organização, pela aceitação das regras estabeleci das e por um gosto pela limpeza.
Anal é quem cumpre todas as regras de trânsito e recrimina todos os que não o fazem. São aqueles cujas secretárias no trabalho estão sempre impecável e irritantemente organizadas. São os que nunca vão de férias sem ter uma relação das despesas e listas exaustivas dos locais a não perder.

NUNO NODIN, Pública, 14-12-08

17/05/09

DESENRASCANÇO

Desenrascanço (loosely translatable as "disentanglement") is a Portuguese word used, in common language, to express an ability to solve a problem without having the knowledge or the adequate tools to do so, by use of imaginative resources or by applying knowledge to new situations. Achieved when resulting in a hypothetical good-enough solution. When that good solution doesn't occur we got a failure (enrascanço - entanglement). It is taught, more or less, informally in some Portuguese institutions, such as universities, navy or army. Portuguese people, strongly believe it to be one of the their most valued virtues and a living part of their culture. Desenrascanço, in fact, is the opposite of planning, but managing for the problem not becoming completely out of control and without solution.
PortugueseForDummies (+ aqui)

25/01/09

INFERNO - Cristiano Ronaldo

Saio para a rua e descubro que a cara de Ronaldo está em todos os jornais: um rosto vulgar, adiposo, des­lumbrado - e o cabelo em forma de crista galinácea, uma agressão estética que faz sucesso entre os lusitanos. Pare­ce que o mundo andou a discutir seriamente se Ronaldo era o melhor jogador de futebol. E respondeu que sim. A ideia já é sufi­cientemente infantil para merecer comentário: centenas de adultos, mer­gulhados em reflexão aturada, em busca das chuteiras geniais.
Mas, com Ronaldo, Portugal relembrou também um aspecto da história pátria: a forma como nacionalizamos feitos individuais par efeitos de propaganda patriótica. Durante 48 anos, não houve atleta, cantor ou artista que a ditadura não tenha usado como símbolo colectivo.
Veio a democracia. Mas, com ela, não veio a atitude saudável de conceder aos indivíduos o que apenas lhes pertence por talento, sorte ou traba­lho. O 25 de Abril, pelos vistos, não passou por aqui.
J.P. COUTINHO, Revista Única, 24-01-09 (adaptado)

29/11/08

ENTRE MARIDO E MULHER...

Em Portugal, o número de mulheres assassinadas duplicou face a 2007. Este ano, que ainda não terminou, 44 mulheres morreram vítimas de violência doméstica. Espanha, com uma população quatro vezes superior, o país cujos habitantes são, segundo o estereótipo, mais agressivos, registou apenas cerca de mais uma dezena de casos. Por cá, todas as semanas, uma mulher é assassinada pelo marido, namorado, companheiro ou ex-qualquer coisa. A este número acrescem mais de 60 tentativas de homicídio. Geralmente perpetradas com armas de fogo, ferramentas. ou armas brancas. E envenenamento.
Porque muitas mulheres ainda não pedem socorro? Receiam as consequências. Outras nem sequer têm consciência de que são vítimas de um crime e resignam-se. E quantas vezes não lemos nos jornais, que os vizinhos «até sabiam», mas nada fizeram?
A violência contra a mulher ainda goza de cumplicidade e impunidade da sociedade porque as mulheres são vítimas de uma violência secular e a visão patriarcal de que a mulher deve ser subalterna ainda domina. É verdade que, sobretudo depois dos anos 60, estas questões deixaram a esfera privada e passaram à esfera pública, passando a ser encaradas como um problema político e de direitos humanos. No entanto, porque estes comportamentos foram, durante milénios, encarados como aceitáveis ou até desejáveis, muito há ainda por fazer.
Pois é. O dito «entre marido e mu­lher não se mete a colher» ainda vin­ga na polícia, na justiça e na polícia. Este ano, em sete distritos não se verificou uma única detenção de agressores. E, no nosso país, só um homem se encontra a cumprir pena de prisão por violência doméstica. Um apenas. Os brandos costumes existem, sim. Estão é do lado errado.

JOANA AMARAL DIAS, in Sexta 28-11-2008 (adaptado)

15/11/08

NOJOOD, 10 ANOS, DIVORCIOU-SE E AGORA É "WOMAN OF THE YEAR 2008"


A revista Glamour descreveu-a como "a mais célebre divorciada" do mundo, mas não foi por isso que a distinguiu, esta semana, como uma das dez Women of the Year 2008. Nojood Mohammed Ali, de dez anos, viajou de Sanaa, capital do Iémen, até Nova Iorque, para partilhar o prémio com Hillary Clinton, Condoleezza Rice ou Nicole Kidman por ter aberto o caminho às meninas que querem libertar-se de casamentos forçados. (…)O drama de Nojood começou quando o pai, um desempregado que antes recolhia lixo nas ruas, quebrou a promessa de não a retirar da escola para lhe arranjar um marido, como fez a outras irmãs.

Ela frequentava a segunda classe e adorava estudar Matemática e o Corão. Ele foi buscá-la para a entregar a um homem de 30 anos, o carteiro Faiz Ali Thamer. No dia do casamento, confiante num alegado compromisso de que a união não seria consumada antes de ela "ser adulta", a menina ficou fascinada com o dote: três vestidos, um perfume, duas escovas do cabelo, dois hijab (véu islâmico) e um anel cujo preço equivalia a 20 dólares. Este foi logo vendido por Thamer, que comprou roupas para si. A partir dali, a vida da recém-casada só piorou. "Eu corria de sala em sala para tentar fugir, mas ele acabava sempre por me apanhar", revelou Nojood ao jornal Yemen Times. "Chorei tanto, mas ninguém me ouvia. Sempre que eu queria brincar no pátio, ele vinha, batia-me e obrigava-me a ir para o quarto com ele. E se seu pedia misericórdia ainda batia e abusava mais de mim. Eu só queria ter uma vida respeitável. Um dia fugi."Nojood apanhou primeiro um autocarro e depois um táxi e foi até a um tribunal de Sanaa. Ela era tão pequenina, que quase passou despercebida aos magistrados, aos advogados e a outros funcionários. À hora de almoço, quando a multidão se dispersava, relatou o diário Los Angeles. Times, "um juiz curioso aproximou-se dela e perguntou-lhe o que fazia sentada num dos bancos". A resposta foi: "Eu vim pedir o divórcio." Mohammed al-Qadhi, o juiz, ficou comovido.
No Iémen, segundo um estudo da Universidade de Sanaa, cerca de 52 por cento das raparigas são forçadas a casar-se antes dos 18 anos. "O exemplo de Nojood vai aumentar a pressão para que se defina uma idade mínima para casar", diz ao PÚBLICO, por telefone, Mohammed al-Kibsi, do jornal Yemen Observer. "Os islamistas do Comité da Sharia [lei corânica] recusam impor limites, mas há um grande movimento da sociedade civil para que o Parlamento aprove este mês uma lei que imponha os 18 anos como idade mínima. Vai haver compromisso, para os 16 anos."
MARGARIDA SANTOS LOPES, Público, 14.11.2008 (adaptado)

22/10/08

SOBRE MACACOS E BANANAS

Suponhamos que temos seis macacos numa sala. Do tecto pende um cacho de bananas. Mesmo por baixo encontra-se um escadote (como o de um pintor ou carpinteiro). Não é preciso passar muito tempo até que um dos macacos suba o escadote para alcançar as bananas.
E assim se inicia a experiência: no preciso momento em que toca no escadote, todos os macacos são molhados com água gelada. Como é natural, isso detém o macaco. Passado um bocado, o mesmo macaco, ou algum dos outros, faz nova tentativa com o mesmo resultado: todos os macacos apanham com a água gelada assim que um deles toque no escadote. Quando este
processo se repete mais um par de vezes, os macacos já estão prevenidos. Mal algum deles pretende tentar, os outros tratam de evitar que o faça, detendo-o com pancada se necessário.
Uma vez chegados a este estádio, retiramos um dos macacos da divisão e substituímo-lo por um novo (que obviamente não participou na experiência até aí). O novo macaco vê as bananas e trata imediatamente de subir pelo escadote. Para seu horror, todos os outros macacos o atacam. E claro que o impedem. Depois de mais um par de tentativas, o novo macaco já aprendeu: se tenta subir pelo escadote, vão agredi-lo sem piedade.
O procedimento é de seguida repetido: retira-se um segundo macaco e introduz-se outro novo. O recém-chegado encaminha-se para o escadote e o processo repete-se: mal lhe toca (no escadote), é massivamente atacado. E não é só isso: o macaco que tinha entrado imediatmente antes dele ( e que nunca passara pela experiência da água gelada!) participa no episódio de violência com grande entusiasmo. Um terceiro macaco é substituído e mal tenta subir o escadote, os outros agridem-no. Todavia, dois dos macacos que lhe batem não fazem ideia do motivo porque não se pode subir o escadote. Substitui-se um querto macaco, depois o quinto e, por fim, o sexto que nesta altura era o único que restava do grupo original. Ao tirar-se este de lá, não resta nenhum que tenha sofrido o banho de água gelada. No entanto, tendo o último tentado subir um par de vezes e sendo furiosamente golpeado pelos outros cinco, fica estabelecida a regra: Não se pode subir o escadote. Quem o fizer expõe-se a uma repressão brutal. Só que agora nenhum dos seis tem argumentos para justificar tal barbaridade.
Qualquer semelhança com a realidade dos seres humano não é pura coincidência nem fruto do acaso. É que somos mesmo assim: como os macacos

17/10/08

NO SUBCONSCIENTE, OS AMERICANOS VÊEM OBAMA COMO ESTRANGEIRO?

O preconceito é subtil, mas estudos mostram que americanos brancos demoram a identificar americanos negros ou asiáticos com símbolos do país
Há alguns anos, os psicólogos Mahzarin Banaji e Thierry Devos mostraram os nomes de celebridades a um grupo de voluntários, pedindo-lhes que as classificassem como americanos ou não americanos. A lista incluía a jornalista televisiva Connie Chung ou a estrela do ténis Michael Chang, ambos americanos de origem asiática, bem como os actores britânicos Hugh Grant e Elizabeth Hurley. Os voluntários identificaram naturalmente os primeiros como norte-americanos e os segundos como estrangeiros.
Os psicólogos perguntaram depois ao grupo que nomes associava a ícones americanos como a bandeira, o Capitólio ou o Monte Rushmore, e quais associava a símbolos estrangeiros: o edifício da ONU em Genebra, uma nota de 100 hrivnis da Ucrânia e um mapa do Luxemburgo. E descobriram que, se tivessem de responder depressa, os voluntários associavam muito mais facilmente os símbolos americanos aos actores britânicos e os estrangeiros a Chung ou Chang.
Os resultados sugerem que, a um nível subconsciente, as pessoas equiparavam os brancos - mesmo os estrangeiros - com símbolos americanos.
Noutra experiência envolvendo atletas negros nos Jogos Olímpicos de Sydney, os psicólogos verificaram que o mesmo padrão se aplicava aos afro-americanos.
Os voluntários brancos concordavam que os saltadores Allen Johnson e Angelo Taylor, que ganharam medalhas de ouro, "contribuíram para a glória da América" e "representam tudo o que a América é". Mas foram lentos a associar as suas fotografias a símbolos americanos. Os voluntários negros foram mais rápidos a associar atletas negras ou brancos a símbolos americanos.
"Isto é poderoso porque mostra que as nossas mentes também distorcem os factos, além das preferências", diz Banaji, que trabalha em Harvard. "Os afro-americanos consideram-se americanos, mas isso não é assim nas mentes de todos os brancos."
As experiências (baseadas em testes disponíveis em implicit.harvard.edu) provocaram controvérsia. Pode ser um embaraço para as pessoas saber que subconscientemente associam ser americano com ser branco, mas isso importa? Importa e muito - por exemplo, no comportamento eleitoral, dizem os investigadores.
Numa série de novas experiências, Devos mostrou que o preconceito "branco equivale a americano" pode ter um papel fundamental nas presidenciais (Banaji é democrata registada; Devos não é americano).
Durante as primárias, Devos, na Universidade de San Diego, e Debbie Ma, da Universidade de Chicago, descobriram que, ao nível subconsciente, as pessoas associavam mais facilmente Hillary Clinton com "ser americana" do que Barack Obama.
Mais surpreendente, os psicólogos descobriram que os voluntários eram mais rápidos a associar o antigo primeiro-ministro britânico Tony Blair com ser americano do que Obama.
A um nível consciente, os participantes não tiveram problemas em identificar Obama e Clinton como americanos e Blair como estrangeiro. Mas as associações subconscientes eram importantes: quem demorava mais tempo a ver Obama como americano a um nível subconsciente tinha menos probabilidades de pensar votar nele do que os que o associavam facilmente com símbolos americanos.
E num último conjunto de experiências, que acabou na semana passada, os investigadores dizem ter encontrado um padrão idêntico quando comparavam as associações subconscientes sobre Obama e o seu rival, John McCain
Conscientemente, os voluntários diziam que ambos são americanos, mas num nível subconsciente eram mais rápidos a associar McCain com ser americano do que Obama - e a força destas associações reflectia-se nas predisposições de voto. "Quando menos viam Obama como americano comparado com McCain, menos provável era que votassem nele", explica Devos. O preconceito era subtil - e apenas um entre muitos factores pesados nas escolhas de voto - mas também conta.


SHANKAR VEDANTAM , Público, 16.10.2008