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03/10/09

A SUBLIMAÇÃO DA ESPERTEZA

A esperteza é uma característica cada vez mais apreciada na sociedade portuguesa. Como se desse uma certa cor ao ambiente de depressão. Nos dias de hoje, ser esperto em Portugal não anda muito longe de ser herói: alguém que, num clima desfavorável, atinge os seus objectivos sem olhar a métodos nem problemas de consciência. Estes novos heróis, que o povo começou por encarar com reprovação mas já se resignou a olhar num misto de complacência, admiração e inveja, nada têm de altruísta. Ao contrário do Super-Homem ou do bombeiro que resgata a criança do fogo, não querem salvar ninguém. São apenas espertos. Mais do que sobreviver, fazem pela vida. Alguns têm até mais do que uma vida, o que dá imenso jeito. Falhada a primeira encarnação, podem sempre partir para mais tarde regressar do além-túmulo, um local naturalmente mortiço onde é fácil recarregar baterias (…).

Os portugueses veneram a esperteza. Todos os dias a perseguem e tentam incorporar na escala do seu pequeno poder individual, seja como condutores no trânsito ou como vulgares mamíferos na fila do supermercado. Em Portugal, os bons exemplos são menosprezados. Não basta ser competente, honesto, colocar brio no que se faz e, se não for pedir muito, fazer uso frequente dessa coisa chamada inteligência emocional - um conceito que nada tem de transcendente e que, depois de bem espremido, resume-se a respeitar e saber viver com os outros.

Acontece que pensar para lá do umbigo é sintoma de fraqueza neste país. Confunde-se com ingenuidade, falta de pulso. É neste contexto que os espertos vingam. Que vivem, morrem e ressuscitam
FRANCISCO CAMACHO, iOnline, 17-08-09

31/07/09

MESCLA CULTURAL NUM PAÍS HOSPITALEIRO

A diversidade cultural portuguesa pode tornar-se desconcertante: recebemos folhetos de um restau­rante indiano na Praça dos Restau­radores, da mão de um goês que fala um inglês perfeito, e encontramos brasileiros a servir em pequenos cafés portugueses. Também há João, «barman» africano de uma casa de fado de Alfama, e o timorense sorridente que espreme sumo de laranja natural para turis­tas. Ainda assim, talvez a experiência mais singular seja ouvir português com sotaque chinês numa pequena mercearia, numa viela calcetada da bela cidade nortenha do Porto.
A demografia da nova Europa multicultu­ral foi redefinida por gente vinda dos países outrora ocupados pelas potências coloniais. No século XXI, em Portugal - país de extra­ordinários navegadores -, o resultado é uma mescla muito interessante, que enriquece um país já de si cheio de interesse.
STAN DENHAM, Sunday Telegraph (Sydney), 28.09.08

17/05/09

DESENRASCANÇO

Desenrascanço (loosely translatable as "disentanglement") is a Portuguese word used, in common language, to express an ability to solve a problem without having the knowledge or the adequate tools to do so, by use of imaginative resources or by applying knowledge to new situations. Achieved when resulting in a hypothetical good-enough solution. When that good solution doesn't occur we got a failure (enrascanço - entanglement). It is taught, more or less, informally in some Portuguese institutions, such as universities, navy or army. Portuguese people, strongly believe it to be one of the their most valued virtues and a living part of their culture. Desenrascanço, in fact, is the opposite of planning, but managing for the problem not becoming completely out of control and without solution.
PortugueseForDummies (+ aqui)

25/01/09

INFERNO - Cristiano Ronaldo

Saio para a rua e descubro que a cara de Ronaldo está em todos os jornais: um rosto vulgar, adiposo, des­lumbrado - e o cabelo em forma de crista galinácea, uma agressão estética que faz sucesso entre os lusitanos. Pare­ce que o mundo andou a discutir seriamente se Ronaldo era o melhor jogador de futebol. E respondeu que sim. A ideia já é sufi­cientemente infantil para merecer comentário: centenas de adultos, mer­gulhados em reflexão aturada, em busca das chuteiras geniais.
Mas, com Ronaldo, Portugal relembrou também um aspecto da história pátria: a forma como nacionalizamos feitos individuais par efeitos de propaganda patriótica. Durante 48 anos, não houve atleta, cantor ou artista que a ditadura não tenha usado como símbolo colectivo.
Veio a democracia. Mas, com ela, não veio a atitude saudável de conceder aos indivíduos o que apenas lhes pertence por talento, sorte ou traba­lho. O 25 de Abril, pelos vistos, não passou por aqui.
J.P. COUTINHO, Revista Única, 24-01-09 (adaptado)