Contas feitas, José Cardoso Pires chegou a um resultado tão surpreendente como inquietante. No seu livro E Agora José, publicado em 1999, o escritor contabiliza 420 anos de censura, nos cinco séculos de existência de imprensa em Portugal. E não é necessário recuar muito, no tempo, para identificarmos um dos períodos mais odiosos e obscurantistas da História portuguesa, caracterizado pela «colonização cerebral, domesticação das vontades, apartheid do conhecimento, privação do saber, mentira premeditada, terrorismo intelectual», conforme observa o jornalista César Príncipe, no seu livro Os Segredos da Censura.
Durante os 48 anos em que se sucederam três ditaduras, a militar, a de Oliveira Salazar e a de Marcelo Caetano, os «coronéis do lápis azul» - assim foram alcunhados os censores por, no início, terem sido chefiados por um coronel e destruírem os escritos dos jornalistas com riscos daquela cor, antes de optarem pela caneta Bic - interpuseram-se entre os emissores das mensagens informativas e os respectivos destinatários, para alterarem, manipularem ou tornarem vazias de sentido as notícias que pusessem em causa o discurso oficial. Simultaneamente, devido à sua invisibilidade, remetiam para os autores a responsabilidade dos textos que recriavam, como nota Orlando César no artigo O Censor como Enunciador do Discurso do Regime, publicado no Notícias da Amadora, em 2001.
Nestas circunstâncias, quem conhecesse Portugal apenas através da leitura dos jornais acreditaria que vivíamos no país das maravilhas. É que não havia aqui prisões políticas, nem contestação do regime, não havia greves nem manifestações de protesto, não se traficava droga, ninguém se suicidava, nenhuma mulher se prostituía, não havia mendigos, nem bairros da lata, nem epidemias, nem delinquentes menores, nem violações, nem pedófilos, nem infanticidas, não estávamos na cauda da Europa nos indicadores culturais, sociais e económicos, nem existia corrupção. César Príncipe comenta: «Assim se escreve a História: a grande como a pequena. Não espanta que, só depois do 25 de Abril, certas camadas populares e pequeno-burguesas teçam pessimismos em relação à liberdade. Antes ( ... ) não se assistia a esta 'pouca vergonha' de se conhecer o que sucede.»
Durante os 48 anos em que se sucederam três ditaduras, a militar, a de Oliveira Salazar e a de Marcelo Caetano, os «coronéis do lápis azul» - assim foram alcunhados os censores por, no início, terem sido chefiados por um coronel e destruírem os escritos dos jornalistas com riscos daquela cor, antes de optarem pela caneta Bic - interpuseram-se entre os emissores das mensagens informativas e os respectivos destinatários, para alterarem, manipularem ou tornarem vazias de sentido as notícias que pusessem em causa o discurso oficial. Simultaneamente, devido à sua invisibilidade, remetiam para os autores a responsabilidade dos textos que recriavam, como nota Orlando César no artigo O Censor como Enunciador do Discurso do Regime, publicado no Notícias da Amadora, em 2001.
Nestas circunstâncias, quem conhecesse Portugal apenas através da leitura dos jornais acreditaria que vivíamos no país das maravilhas. É que não havia aqui prisões políticas, nem contestação do regime, não havia greves nem manifestações de protesto, não se traficava droga, ninguém se suicidava, nenhuma mulher se prostituía, não havia mendigos, nem bairros da lata, nem epidemias, nem delinquentes menores, nem violações, nem pedófilos, nem infanticidas, não estávamos na cauda da Europa nos indicadores culturais, sociais e económicos, nem existia corrupção. César Príncipe comenta: «Assim se escreve a História: a grande como a pequena. Não espanta que, só depois do 25 de Abril, certas camadas populares e pequeno-burguesas teçam pessimismos em relação à liberdade. Antes ( ... ) não se assistia a esta 'pouca vergonha' de se conhecer o que sucede.»
VISÃO, 23-04-09