10/04/09

O SENTIDO DAS PALAVRAS

(…) as palavras da linguagem comum, tal como os conceitos que elas expri­mem, são sempre ambíguas e o seu directo emprego científico, a partir do seu uso normal, sem as submeter a nenhuma transformação, con­duziria às mais graves confusões. Não apenas o sentido dessas pala­vras está tão mal definido que varia dum caso para o outro, ao sabor das necessidades, mas ainda, visto que a classificação de que elas resultam não procede de uma análise metódica e apenas traduz as impressões confusas das pessoas, acontece permanentemente que categorias de factos muito diversos são indistintamente reunidas sob uma mesma rubrica ou que realidades da mesma natureza recebem designações muito diferentes. Se portanto se aceita a acepção vulgar, corre-se o risco de distinguir o que deve ser confundido ou de confun­dir o que deve ser distinguido, ignorando-se assim o real parentesco das coisas e, consequentemente, a respectiva natureza. Só se explica comparando. Uma investigação científica só pode, assim, atingir o seu objectivo se se refere a factos comparáveis e tem tanto mais pro­babilidades de êxito quanto mais certa esteja de reunir todos aqueles que podem ser utilmente comparados. As afinidades naturais dos seres, porém, não poderão ser detectadas com um mínimo de segu­rança através de exame superficial como aquele de que a terminolo­gia vulgar resultou; consequentemente, o objecto das pesquisas não pode ser constituído pelos grupos de factos já organizados aos quais correspondem as palavras da língua corrente.

ÉMILE DURKHEIM, O Suicídio