A recente explosão dos jogos nas redes sociais, sobretudo no Facebook (não apenas porque é a mais numerosa rede mas sobretudo porque é a que melhor se adapta a esse tipo de experiência) veio enfatizar as épocas especiais do calendário e, consequentemente, o modo como nos relacionamos com os outros nesses referidos momentos
A maioria destes jogos, e em especial os da Zynga (Mafia Wars, Farmville, Yoville, Café World, etc.) abordaram a época do Natal e do Ano Novo introduzindo uma panóplia de novos conteúdos dos quais listo apenas alguns a título de exemplo: uma árvore de Natal onde se guarda as prendas enviadas pelos amigos (o que pode repetir-se uma vez por dia) e que se abrem no dia 25 de Dezembro; suplementos ("boosts") para combates que são garrafas de campanhe; fogo de artifício que se pode lançar na última noite do ano. (...)
É óbvio que já antes o Facebook tornou possível enviar deliciosos ícones aos amados no dia 14 de Fevereiro ou parabenizar os aniversários dos amigos. Melhor: agora é quase impossível esquecer as datas desses aniversários, basta estar ligado ao computador, tudo pode ser automatizado. Neste caso há dois efeitos imediatos da Rede: não só alargamos um certo tipo de comportamento que antes estaria reservado a amigos mais próximos, como dependemos (é uma opção, não uma condição) desses sistemas técnicos para gerir uma boa parte das nossas vidas sociais.
Mas o fenómeno mais marcante parece-me ser a definitiva instalação do calendário Ocidental e cristão a nível global. Na verdade a parte maior da população mundial não começou um novo ano a 1 de Janeiro (nem sequer vivem no ano 2010) nem celebram o nascimento de Cristo, ou melhor, Cristo não pertence à sua mitologia religiosa. Têm-nos aturado estas particularidades porque o Ocidente ainda é o motor da economia e porque, sendo óbvio que tem de existir um norma-padrão para conseguirmos entender -nos uns aos outros, porque não a dos tipos que inventaram os computadores e os sistemas operativos? (os relógios mais importantes nos dias de hoje).
Verdade é que que vi vários amigos que vivem noutros calendários e professam outras crenças a aderir alegremente a estas pequenas diversões de Natal e Ano Novo. O efeito do Facebook, e outras redes sociais, pode vir a demonstrar-se mais avassalador que os muitos missionários que daqui partiram durante séculos. É a normalização global, total.
Dr. Bakali, O Ponto de Fuga (Blog JL)